Diário do Comércio, 31 de outubro de 2012
A derrota do sr. José Serra em São Paulo
demonstra, pela enésima vez, que é impossível vencer o PT e seus aliados
sem fazer precisamente as duas coisas que a oposição tem evitado a todo
preço: (1) livrar-se do resíduo ideológico “politicamente correto”,
adotando um discurso conservador sem concessões nem atenuações; (2)
denunciar incansavelmente a aliança criminosa de partidos comunistas e
quadrilhas de narcotraficantes – o Foro de São Paulo.
Quem duvida que o sucesso de
Magalhães Neto, em contrapartida, deveu muito à nostalgia de um
conservadorismo linha-dura que o seu nome de família ainda evoca na
imaginação do eleitorado baiano? Antonio Carlos Magalhães nunca foi um
conservador em sentido estrito, mas, faute de mieux, a esquerda
fez dele o símbolo quintessencial da direita, e, ao menos nos seus
últimos anos, ele vestiu a camiseta com alguma bravura, cujo prestígio
agora reverte em benefício do seu neto.
Uma das razões mais óbvias do
triunfo da esquerda, não só no Brasil mas em toda parte, é a
solidariedade profunda, a aliança inquebrantável entre seus setores
moderados e radicais, sempre articulados para bater no adversário com
duas mãos. Na direita, ao contrário, os moderados, menos ciosos do seu
futuro político que da imagem que exibem na mídia esquerdista, tratam
de marcar distância dos radicais, seja fingindo ignorá-los, seja mesmo
insultando-os, ao menos da boca para fora.
A mensagem que isso transmite ao eleitor é clara:
o esquerdismo é um remédio bom, do qual se pode, no máximo, discutir a
dosagem; o direitismo, ao contrário, é um veneno que só pode ser bom em
doses mínimas.
É preciso ter subido muito na
escala da idiotice para não entender que isso é a política de quem já se
acostumou tanto com a derrota que já não pode viver sem ela.
O PT não se inibe de aliar-se ao
PSOL, ao PSTU, aos Sem-Terra e até, mais discretamente, às Farc. Mas
quem pode imaginar os homens do DEM – para não falar de José Serra –
posando numa foto em visita, mesmo de pura cortesia, ao Instituto Plínio
Correia de Oliveira ou ao Clube Militar? Cito essas entidades de caso
pensado: elas nada têm de radical, mas assim as rotulou a mídia
esquerdista para isolá-las da direita oficial, que, como sempre, aceitou
servilmente jogar segundo a regra imposta pelo adversário.
O mais elementar bom-senso
político ensina que toda maioria moderada precisa dos radicais – ou de
quem o pareça -- para dizer em público o que ela não pode dizer. Ensina
também que a minoria enfezada só pode ser posta sob controle quando
inserida numa aliança. A esquerda já aprendeu isso há décadas. A direita
nem começou a pensar no assunto.
Na França, a vitória da esquerda teve como causa
principal ou única a impossibilidade de um diálogo entre a direita
gaullista e o Front National. Nos EUA, em 2008, John McCain jamais teria
perdido a eleição se não houvesse caprichado tanto naquele bom-mocismo
centralista que os conservadores abominam. E no Brasil o sr. José Serra
teria tido uma carreira mais brilhante se atirasse à lata de lixo da
História um passado esquerdista que, quanto mais ostentado, mais honra e
eleva a imagem dos seus inimigos. Desculpem-me por insistir no óbvio,
mas, neste país, o óbvio vai-se tornando cada vez mais um segredo
esotérico, só acessível a um círculo de iniciados: num campeonato de
esquerdismo, vence, por definição, o mais esquerdista. O eleitorado
brasileiro é maciçamente conservador, mas, não tendo quem o represente
na política, acaba votando a esmo, conforme simpatias de momento ou
interesses de ocasião que no fim o tornam tão corrupto, ao menos
psicologicamente, quanto os políticos que ele despreza. O voto
interesseiro vai, necessariamente, para quem está no poder, para quem
controla a usina de favores. A oposição teria tudo a ganhar se
contrapusesse a esse estado de coisas um discurso ideologicamente
carregado, restaurando o senso da política como conflito de valores em
vez de mera disputa de cargos. Mas ela não vai fazer isso. Há tempos ela
já se persuadiu de que acumular derrotas é mais confortável do que
fazer um exame de consciência.
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