Por André,
Descobri, por intermédio do grupo editorial É Realizações o autor romeno Andrei Pleșu. Texto preciso, agradável e com um senso estranho a muitos leitores. A qualidade da produção dos romenos é incrível (particularmente, até então, eu conhecia apenas Emil Cioran). O amigo William Campos da Cruz deu a dica deste trecho do filósofo, deveras curioso e ilustra bem boa parte da minha visão quanto a intelectualidade e a postura do intelectual diante do conhecimento:
O
que temos de ter em mente, então, é que o funcionamento relativamente
normal da vida intelectual sob as condições da marginalidade imposta
pela ditadura comunista ocasiona uma experiência de marginalidade que,
no caso dos países pequenos, não depende do comunismo, mas o precede. De
qualquer forma, a partir desta combinação sui generis de dois tipos de
marginalidade, surgiu uma espécie de intelectual que, nas sociedades
ocidentais, já há muito saiu de moda e que, provavelmente, está prestes a
desaparecer também no Leste Europeu. Eu o chamaria de “intelectual
abnegado (nonprofit)” – um intelectual
que faz seu trabalho sem nenhuma motivação externa, sem nenhuma
finalidade palpável. Não delimita sua vocação de acordo com as
prioridades do momento, não regula seus esforços sob a pressão de
cronogramas fixos, não formula questões de maneira que garantam
generosos patrocínios. Sob a influência alucinatória da especulação
pura, livre da obsessão de ser competitivo e do ritmo mecânico da
promoção acadêmica, este tipo de pesquisador não se integra facilmente
na vida institucional. Ele é sua própria instituição. Na pior das
hipóteses, ele se perde em brilhantes apresentações retóricas e corre o
risco de se tornar um fracasso pitoresco. Mas, se for bem sucedido, seu
sucesso é o sucesso da livre investigação, da abordagem pouco
convencional, do imprevisto. O intelectual que tenho em mente não tem
inibições quanto às fronteiras das disciplinas. Uma vez que aprendeu a
sobreviver sem apoio oficial, não se sente responsável perante
autoridades externas; sente-se justificado por seus dons e sua
eficiência e não tem de prestar contas a respeito de sua
“originalidade”. É um economista, mas se interessa por Edmund Husserl e
Ludwig Wittgenstein; é um erudito classicista, mas também estuda a
economia de mercado nos países pós-comunistas; é um físico muito
interessado em literatura mística. Tem um critério e um motivo apenas:
curiosidade, a curiositas que Cícero considerava a fonte do conhecimento
desinteressado, nulla utilitate obiecta. O estudioso de hoje corre o
risco de ser um erudito e deixar de ser curioso. O intelectual abnegado é
mais fiel à tradição socrática, segundo a qual a pergunta é mais
consistente que a resposta, o caminho é mais certo que o fim.
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Andrei Pleșu |
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